quarta-feira, 7 de julho de 2010

A Rolha

Ela, a Rolha....


Pode ser feita de cortiça, alumínio, plástico ou vidro, são estas as matérias-primas utilizadas na fabricação de vedantes(gostei) para garrafas de vinho (as famosas rolhas). Mas nem sempre foi assim. Até há bem pouco tempo a rolha de cortiça era o único vedante (rolha) utilizado. O exponencial aumento dos engarrafados a partir da segunda metade do século passado e, fundamentalmente, o aumento de problemas com o “gosto a rolha” atribuído à rolha de cortiça, desencadeou uma revolução no mercado de vedantes (gostei do termo vedante, muito utilizado pelos nossos irmãos luzitanos)) para vinho. Apesar de tudo o que foi feito ou refeito, a rolha perfeita continua a não existir, e com a utilização de novas tecnologias, o que não falta são soluções "milagrosas".




A nobre cortiça




A cortiça é a casca do sobreiro (Quercus Suber L), uma árvore nobre com características muito especiais e que cresce nas regiões mediterrânicas como Espanha, Itália, França, Marrocos, Argélia e, sobretudo, Portugal, onde existem mais de 720 mil hectares de montado de sobro, bem como uma indústria corticeira de grande importância económica.
É uma árvore espantosa, de grande longevidade e com uma enorme capacidade de regeneração. Consegue viver em média 150 a 200 anos, apesar dos muitos descortiçamentos que lhe fazem ao longo da sua existência: cerca de 16 intercalados por períodos de nove anos.
A cortiça consiste num tecido vegetal com centenas de milhões de células suberizadas (formar a cortiça no sobreiro - árvore que produz a cortiça), inertes e impermeáveis. Estas células, cheias com gás, formam uma estrutura compressível e elástica. A cortiça pode ser comprimida para metade do seu volume sem perder flexibilidade e possui a particularidade única de poder ser comprimida numa dimensão sem alterar a outra. Estas características fazem da cortiça um vedante natural impermeável com extraordinária eficácia. Ao longo de séculos tem ajudado a escrever a história do vinho que hoje conhecemos. É, por assim dizer, o maior aliado do homem na conservação e melhoramento dos vinhos acondicionados em garrafa. Para muitos a rolha de cortiça é parte integrante da imagem da garrafa de vinho. Até quando?. hummmm prá mim... para sempre.....história e tradição merecem respeito.




Início das Hostilidades (Portugal, a Revolução dos Cravos)




A revolução de Abril de 1974 trouxe os primeiros problemas à rolha de cortiça. Os montados (local onde se plantam as arvores - sobreiro - que produzem a cortiça - materia prima da rolha) mudaram de mãos e a cortiça era por vezes tirada apenas com 6 anos de idade.
Na década de 80, a qualidade das rolhas diminuiu significativamente e no final da década surgiam os primeiros processos movidos por produtores de vinho australiano contra os seus fornecedores de rolhas.
Por mais que a lei ajudasse ao produtor o negócio da rolha de cortiça natural começou a estremecer.
Em 1989, a indústria portuguesa de fabricação de rolhas era fortemente censurada por muitos produtores de vinho. Meio mundo reclamava da fraca qualidade das rolhas de cortiça. Nesse mesmo ano, enquanto poderosas cadeias inglesas de distribuição começam a testar rolhas sintéticas e cápsulas de rosca.



O “Calcanhar de Aquiles” da Cortiça




O 2-4-6 Tricloroanisol (TCA) foi considerado o principal culpado. É um composto químico responsável pelo gosto de mofo, o bolor em cerca de 80% dos vinhos contaminados. Este poderosíssimo contaminante pode estar presente em papel, cartão, plástico, vidro, recipientes metálicos, madeira, barricas e também...na cortiça. Uma simples gota em uma piscina olímpica é suficiente para contaminar a água.
É um químico complexo com várias origens: fungos presentes nas imperfeições da estrutura celular da cortiça, os polifenóis próprios da cortiça e produtos utilizados na preparação da cortiça interagem parcial e integralmente levando à formação deste composto.Contudo, o “gosto de rolha” não é apenas atributo do TCA. Existem outros cloroanisóis como o tetracloroanisol (2-3-4-6 TeCA detectável a 10 ng/l) ou o mais preocupante tribromoanisol (2-4-6 TBA detéctavel a 4 ng/l) formado a partir do tribromofenol, usado como pesticida nas estruturas de madeira das adegas, que pode contaminar barricas, rolhas, plásticos, cartão ou madeira das caixas de vinho.
Tudo isto foi jogado no mesmo saco e as culpas caíram todas, e ao mesmo tempo, na nobre e valorasa rolha de cortiça. Contaminação inaceitável... a cortiça destrói os nossos vinhos,... é em suma o que transcreviam os inúmeros artigos escritos sobre o tema em finais dos anos oitenta, no preciso momento em que os vinhos iniciam uma ascensão de preços nunca antes testemunhada.




Rolhas alternativas




Rolhas sintéticas, cápsula de rosca (screwcap), rolha de vidro e a Zork.
Começando pelas primeiras, a tecnologia moderna ainda não conseguiu criar um substituto sintético para a rolha de cortiça natural. Existem inúmeras rolhas deste tipo no mercado mas múltiplos estudos aconselham apenas o seu uso em vinho de consumo rápido (um, dois anos máximo).
Esta rolha não veda totalmente a garrafa e permite importantes trocas de oxigénio com o vinho engarrafado , levando à sua oxidação precoce. Entre as várias marcas sobressaem a Nomacork, Neocork e Nukorc. São baratas, visualmente atraentes e podem ser usadas nas linhas de engarrafamento convencionais.
A cápsula de rosca tem sido o vedante mais popular na guerra contra a rolha de cortiça natural. São uniformes, muito fáceis de abrir e vários estudos comprovam que é o vedante que mantém os níveis mais elevados de antioxidante.
Tem a vantagem de evitar oxidações e a desvantagem de promover reduções com inerentes aromas desagradáveis.
No entanto, a imagem que têm junto do consumidor (europeu principalmente e especialmente os enochatos) desprestigia o vinho que usa a cápsula de rosca, é um vinho barato de todos os dias, é um vinho com pouco estatuto, enquanto a rolha mantém as preferências de estética, ambientalista, para não esquecer o ritual do abrir da garrafa com o saca-rolhas.
O vedante(adorei este termo) de vidro Vino-lok, usado por muitos produtores de vinho alemão e austríaco, é outra alternativa a ter em conta. É inerte, neutra, muito eficaz como vedante, é reciclável e esteticamente perfeita, apenas uma desvantagem – o preço que por enquanto se mantém elevado.


A rolha australiana Zork é outra alternativa interessante para vinhos de consumo rápido, atraente, fácil de utilizar e pode também ter futuro.
Por último, a Pro-cork que usa cortiça natural isolada por uma membrana de 5 camadas em cada extremidade que não permite contacto do vinho com a rolha e assegurando a impermeabilidade. Esta é uma alternativa que junta cortiça com sintéticos de um modo eficiente.










A Guerra das rolhas




A “Guerra das Rolhas” está apenas começando. Neste debate global, os números e dados científicos apresentados por cada indústria favorecem a própria em detrimento da concorrência. Ninguém se entende e muitas das vezes é mais o preço a orientar a escolha do produtor que qualquer outra coisa. Nos estudos e pareceres veiculados por ilustres técnicos e universidades as conclusões são muitas das vezes contraditórias.Perante a crescente concorrência, a indústria corticeira tem respondido a um bom nível. Centenas de milhões de euros têm sido investidos na erradicação do TCA, na criação de novos tipos de rolha assim como na certificação maciça dos procedimentos tecnológicos das inúmeras empresas. Os resultados têm vindo a revelar-se positivos. Esta conclusão surge não só de múltiplos estudos feitos em vários pontos do Mundo como também da experiência prática da Revista de Vinhos recolhida ao longo dos painéis de prova dos últimos anos.
A rolha de cortiça, que há 3 séculos criou o vinho que conhecemos hoje, é um vedante(oha ela ai de novo) para o qual hoje há concorrência efetiva, mas pensamos que dificilmente deixará de cumprir a missão para qual a natureza a criou.
Quanto às alternativas: as rolhas sintéticas são as que menos têm provado, enquanto que a cápsula de rosca continua a conquistar adeptos em particular em países pragmáticos e poucos arreigados à tradição (Austrália e Nova Zelândia) e quase sempre escolhida para vinhos brancos, rosés e tintos jovens.
A sua resposta a vinhos com potencial de envelhecimento mantém-se uma incógnita.
Quantos às restantes que existem e outras mais que poderão aparecer veremos que história terão para contar no futuro.
Mas, como sempre tenho dito, uma taça de vinho é para celebrar, sozinho ou acompanhado das pessoas afetivamente próximas, a garrafa (um dia falarei delas) a rolha, as taças são acessórios, merecem seu respeito, mas lembre-se, o melhor vinho não é o mais caro, o que tem a mais bela garrafa, o que é bebido em uma taça de cristal, o que é vedado na mais pura rolha de cortiça, mas sim aquele que nos dá prazer.
Bons vinhos !!!

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